Provas Ilícitas em Processos Administrativos: Implicações e Regras para o Não Aproveitamento

28/07/2024 - 08:46 - Gisele Silva

A declaração de ilicitude da prova não se limita ao processo em que foi coletada; ela se estende a qualquer uso que possa prejudicar o cidadão, tanto no âmbito judicial quanto em processos administrativos. Essa interpretação é sustentada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e foi reafirmada no julgamento dos embargos de declaração que firmaram uma tese vinculante, seguindo o rito da repercussão geral.

No voto do ministro Gilmar Mendes, foi mantida a conclusão do Plenário sobre a tese aprovada. O caso em questão envolve uma condenação imposta pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), a qual foi anulada devido à utilização de provas consideradas ilícitas, oriundas de uma ação penal, que também foram invalidadas judicialmente.

A tese que foi aprovada afirma que são inadmissíveis, em processos administrativos de qualquer tipo, provas que foram consideradas ilícitas pelo Poder Judiciário. Durante a análise dos embargos de declaração, julgados virtualmente em sessão encerrada em 1º de julho, a Procuradoria-Geral da República solicitou a reavaliação da tese para fins de esclarecimento.

O STF deveria examinar a possibilidade de que um juiz poderia admitir e valorar provas consideradas ilícitas no contexto penal, mas que poderiam ser produzidas de maneira autônoma ou independente no processo administrativo. No entanto, os embargos foram rejeitados por unanimidade, e o ministro Gilmar Mendes enfatizou que esse tema não foi analisado durante o julgamento do STF.

O recurso extraordinário teve como objetivo avaliar a possibilidade de aproveitamento de provas declaradas ilícitas em instrução processual penal dentro de um processo administrativo. O ministro avançou a argumentação, afirmando que a autonomia da prova, mesmo sendo considerada ilícita, pode tornar a fonte probatória em questão válida. Em outras palavras, se a prova contestada é independente da ilicitude do material no contexto penal, ela é válida.

A tese aprovada pelo Plenário do STF reafirma a posição já consolidada na corte sobre a inadmissibilidade de provas declaradas ilícitas pelo Poder Judiciário, aplicável em qualquer contexto ou instância decisória. Essa interpretação é uma consequência de outra jurisprudência que permite a admissibilidade de provas emprestadas do processo penal em ações administrativas, desde que essas sejam produzidas de maneira legítima e regular.

Um exemplo prático dessa aplicação está no caso do HC 232.918, julgado em outubro de 2023, onde o ministro Gilmar Mendes concedeu a ordem para trancar procedimentos investigatórios criminais (PICs) contra suspeitos de crimes tributários. Esses pic foram baseados em materiais coletados através de mandados de busca que posteriormente foram invalidados por um acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

Os materiais coletados subsidiaram a instauração de procedimentos administrativos para lançamento do tributo supostamente devido pelos contribuintes. Diante da falta de pagamento, a Receita fez representações para fins penais e encaminhou ao Ministério Público de Minas Gerais. A defesa, composta pelos advogados Rafael de Almeida Moura, Felipe Augusto Ribeiro de Miranda, Délcio de Oliveira Fernandes Jr. e Palomo Simas de Faria, resultou no trancamento dos procedimentos.

A posição do STF sobre a impossibilidade de utilizar provas consideradas nulas em outros contextos levou também o ministro Gilmar Mendes a anular uma condenação por improbidade administrativa no RE 1.412.648, uma vez que essas provas foram declaradas nulas em processo penal. Sem a materialidade do fato, a sentença criminal reconheceu a inexistência da materialidade.

“Não se pode desconsiderar que, uma vez declarada a ilicitude da prova, essa repercute em todas as esferas”, concluiu o relator. Para mais informações, clique nos links: ARE 1.316.369, RE 1.412.648, HC 232.918.

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